Martha H T de Souza: Casa Verônica

Redação do Diário

Martha H T de SouzaEmpresária rural

Tivemos, aqui em Santa Maria, por longos anos, o pensionato da Verônica. Mãe loira, como era carinhosamente chamada, lutava não apenas pelos direitos de outras travestis, mas também pelas mulheres e crianças em situação de vulnerabilidade. Comunidades carentes contavam com ajuda para os materiais escolares, alimentos e outros insumos que ela distribuía para os mais necessitados. Sua casa acolheu muitas mulheres trans advindas de diferentes regiões do Brasil. Os motivos para procurarem este alojamento eram semelhantes: a exclusão pela família biológica, do ambiente escolar e a consequente falta de oportunidades no mercado de trabalho. No pensionato, criavam novos laços e ampliavam a noção de família, construindo relações de afeto, se reconhecendo por “manas”. Tive o privilégio de conhecer essa grande mulher e ter aulas práticas de solidariedade, respeito, amizade e afeto. As vozes das moradoras evidenciavam que, apesar de desviarem dificuldades nos seus percursos, muitas continuavam sendo assassinadas. Esse também foi o caso da Verônica, morta em 12 de dezembro de 2019.

No dia 3 de novembro de 2021, a UFSM criou o Espaço Multicultural Casa Verônica, instituindo a Política de Igualdade de gênero. Trata-se de importante conquista da comunidade acadêmica. Certamente, será um centro de referência na promoção de cidadania e enfrentamento e responsabilização em casos de desumanidade. Localizado nas dependências da biblioteca da UFSM, oferecerá atividades educacionais incluindo rodas de conversa, oficinas, cursos, atendimento psicossocial e orientação jurídica. Para quem tanto sonhou em continuar os estudos, como foi o caso da Verônica, é uma justa homenagem dessa instituição de ensino.

Consideramos um importante avanço a criação de locais que promovam o cuidado com pessoas LGBTIA+, bem como discutam temas relacionados as questões de gênero no país que mais mata pessoas trans e travestis em todo o mundo. País este que, apesar dos apelos, segue cometendo atrocidades contra as mulheres. Os ataques são uma realidade na vida das brasileiras, que vão desde o assédio moral e sexual até o feminicídio. A realidade da violência não passa ao largo de nenhuma de nós, seja através de alguém que conhecemos ou de quem ouvimos falar, desde sempre.

Nesta semana, tivemos mais um caso de feminicídio em Santa Maria. Apesar das campanhas e alertas, meninas e mulheres seguem se envolvendo com homens abusivos, acreditando que gestos mínimos de atenção bastam para modificar comportamentos selvagens.

Aliás, frequentemente, temos que dizer o óbvio quando o assunto envolve questões femininas: criança não é mãe e estuprador não é pai. A lei no Brasil autoriza casos de aborto em três situações: perigo de vida para a gestante, quando decorrente de estupro ou por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no caso de anencéfalos. Qual foi a dúvida da juíza? Em outro caso, a carta da atriz Klara Castanho rasga nossos corações e nos faz refletir sobre as questões éticas que envolvem os profissionais e serviços de saúde.

Enfim, deixamos claro: nem mais um pouquinho! Queremos respeito e justiça para as questões que envolvem o gênero feminino.

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